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domingo, 13 de fevereiro de 2011

DEPOIS DO OURO: IDENTIDADES LOCAIS EM SERRA PELADA, 1980-1992

Por: Manoel Oliveira da Silva

 
Capítulo I
A Organização dos garimpeiros

Muitos se espantam em saber que o ouro, em si mesmo um bem tão inútil, goze de tamanha estima em toda parte, que mesmo os homens para quem foi feito e pelos quais o valor lhe é atribuído sejam concebidos como dotados de menor valor que o próprio ouro.
                                                                                                Thomas More (1478-1535) Utopia.

Até o final do mês de maio de 1980, o garimpo de Serra Pelada funcionou como os demais garimpos da Amazônia. Cenário hostil e acintoso à ordem pública e segurança da comunidade de garimpeiros (João Brasil, 2004. p.76). A partir dessa data, porém, o governo federal interviu, montando relativa infra-estrutura para poder de perto exercer o controle e a fiscalização da produção do garimpo.
Quando o Major Curió chegou a Serra Pelada, designado pelo Presidente da República, as condições no garimpo eram sub-humanas. Havia surto de meningite e morriam cerca de três garimpeiros por dia, fora os que morriam assassinados. Além de um corpo de segurança formado com alguns velhos conhecidos no combate às guerrilhas, o major Curió contava também dentro do garimpo com outro tanto de “bate-paus”[1], o que lhe garantia um controle absoluto da situação. Nada se resolvia sem a sua palavra. Para esses garimpeiros, que antes viviam no meio do mato, fazendo suas próprias leis, o major Curió passou a ser uma espécie de “deidade”. Começava a nascer o mito (KOTSCHO. 1984 p.16).
Serra Pelada foi o primeiro garimpo em que o Governo Federal entrou para organizar e garantir trabalho a milhares e milhares de homens vindos do Maranhão, Ceará, Goiás e Pará, coincidentemente as regiões mais pobres do país. O propósito do Governo era, segundo Kotscho, apoderar-se de toda aquela riqueza para saudar a divida externa brasileira. [2]
A comercialização do ouro que antes era feita pelo dono da fazenda, passa a ser feita pela Docegeo-Rio Doce Geologia e Mineração S/A, agente comprador da Caixa Econômica Federal (Portaria Interministerial nº. 247 de 15/05/1980)[3]. Além da Caixa Econômica Federal que funcionava como as casas de fundição do século XVIII, e da Docegeo que era subsidiaria da CVRD, foram sendo instalados vários outros órgãos federais no garimpo, que na verdade se assemelhava às medidas tomadas pelo rei de Portugal, para proteger o “quinto” real. A única diferença é que o ouro de Serra Pelada não trazia o selo real.
Outra semelhança com os períodos coloniais se dava no momento da comercialização. No século XVIII, o ouro que era vendido, sempre “perdia” peso nas Casas de Fundição, tal qual aconteceu em Serra Pelada com o paládio e a prata dos garimpeiros que vem agregada ao ouro.
Em Serra Pelada nessa época atuavam outros órgãos governamentais tais como: Companhia Brasileira de Alimentos (COBAL), Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM), Departamento de Polícia Federal (DPF), Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (EBCT), Fundação Serviço de Saúde Pública (FSESP), Polícia Militar do Estado (PM), Secretaria da Receita Federal (SRF), Superintendência de Campanha de Saúde Pública (SUCAM) e Telecomunicações do Pará S/A (TELEPARÁ).
A história dos garimpos de ouro e diamantes no Brasil é marcada, desde o início do século XVIII, por tensões, ambigüidades e constantes atritos com o poder instituído. Basta lembrar o vasto número de conflitos em torno do fisco opondo representantes da Coroa e interesses mineradores durante todo o século XVIII[4]. Segundo Luciano Rodrigues Costa,[5] a fluidez, o potencial de desordem, a incerteza dos resultados e a mobilidade geográfica da atividade foram sempre altamente problemáticas para o Estado.
         Para ele, O garimpo de ouro e diamantes foi historicamente organizado segundo padrões tecnológicos e gerenciais muito rudimentares, com o predomínio de relações de trabalho não-salariadas e uma reduzida divisão do trabalho (Luciano Costa, 2007). Luciano afirma ainda que:
Desde muito cedo, a atividade mineradora [...] em todo o Brasil, representou um foco de tensões e conflitos: de um lado, as pretensões de um Estado distante, mas ávido por mapear, mensurar, documentar, controlar as concessões de mercês e, especialmente, tributar pesadamente, e de outro, os interesses dos descobridores e exploradores de jazidas, ciosos em guardar para si, ocultar e garantir a posse daquilo que consideravam fruto do próprio empenho e sorte. De um lado, em um jogo de muitos artifícios, conflitos, alinhamentos e realinhamentos contínuos, a atividade foi se organizando a partir da clivagem entre concessões reconhecidas legalmente e de largo cabedal, do outro lado, um mundo clandestino e sempre movente — o dos garimpos (Luciano Costa, 2007).
A história do garimpo no Brasil, desde o seu surgimento, foi profundamente marcada pelas flutuações e ambigüidades do estatuto institucional a ele imposto pelo Estado. Reconstruindo a trajetória histórica desses empreendimentos de mineração, podem-se encontrar vários momentos em que a atividade garimpeira seria intensamente perseguida pelos órgãos fiscais como um trabalho ilegal.
O termo garimpeiro emergira na região das minas em inícios do século XVIII de acordo com o autor, e designava aqueles que, desrespeitando a legislação da coroa portuguesa, mineravam as jazidas localizadas em pontos ermos do território, escondidas nas “grimpas” das serras. Neste sentido, a própria etimologia da palavra garimpeiro já denotava ilegalidade, marginalidade e repressão da força de trabalho.[6] É importante ressaltar que nos séculos XVIII e XIX, os garimpeiros foram tratados como marginais ou desclassificados sociais. Neste sentido dependeram:
[...] dos humores dos Intendentes e Ouvidores, ora ferozmente caçados pelos capitães do mato, ora tolerados como agentes mineradores, permitindo-se até mesmo ao garimpeiro residir nas vilas. Sempre clandestino, diferenciou-se do minerador não pelo modo como extraía o bem mineral — ambos braçais e de pouca técnica —, mas pela condição de ilegalidade (SALOMÃO, 1984, p. 44).
Somente em 1930, com Getúlio Vargas como chefe do Governo Provisório, e como parte de seu programa de governo, que se pretendia popular e nacionalista, foi estabelecido um direcionamento distinto à questão mineral e, por conseqüência, ao garimpeiro (Luciano 2007).
O Decreto de 1934, como parte do projeto corporativo do Estado Novo, traduzia uma visão bastante favorável ao garimpeiro e o entendia dentro de uma dimensão bastante realista, sendo o primeiro documento oficial a valorizar a sua atividade, embora com uma boa dose de paternalismo [7]. No preâmbulo do decreto, Vargas afirmava.  
 [...] é necessário congraçar os faiscadores e garimpeiros nos moldes do sindicalismo — cooperativas para a defesa dos seus interesses, a prática de melhores métodos de trabalho e a melhoria de seus proventos. [8]
De acordo com Ana Maria Martins Barros, se formos analisar a palavra Cooperativa, ela nos parecerá muito familiar, uma vez que ela possui uma etimologia idêntica à de Cooperação, e, cooperação é um termo com o qual convivemos diariamente desde a infância.[9] Segundo ela, esses organismos são criados visando uma melhoria de vida das pessoas. Por isso esta forma de se organizar em Cooperativa tornou-se um meio das pessoas se fortalecerem, unidas para buscar a solução dos seus problemas comuns, embora muitas vezes algumas destas entidades se desviem do seu objetivo e se tornem instrumentos de poder e dominação.[10]
Para o Dicionário Aurélio, a palavra Cooperativa significa: “sociedade ou empresa construída por membros de determinado grupo econômico ou social e que objetiva desempenhar, em beneficio comum, determinada atividade econômica”.
Guarechi afirma que:
 “A Cooperativa é uma associação de pessoas que trabalham juntas, mais difere do Sindicato pelo fato de ser também uma empresa econômica, isto é, reúne trabalho, capital e administração, tecnologia e natureza. Na parte econômica ela funciona como qualquer empresa. Mas a diferença está na parte social, isto é, nas relações que se estabelecem entre as pessoas e o capital (entre trabalho e capital).”
Para este autor, é importante que se conheça os famosos princípios cooperativistas dos pioneiros de Rochdale, uma cidade da Inglaterra, onde um grupo de pessoas iniciou essa experiência. Até hoje esses princípios são tidos como essenciais numa cooperativa autêntica, que são:
- Adesão livre: entra quem quer, sai quem quer;
- Gestão democrática: tudo decidido por eleição, sendo que cada pessoa vale              um voto, independente de quanto capital ela tenha;
- Distribuição das sobras: os lucros são repartidos conforme a quota de cada pessoa; não é da política cooperativista a acumulação dos lucros, transformando-os em capital imobilizado;
- Juros limitados ao capital: o capital sempre está em função da pessoa e não se transforma como no capitalismo em produtor de riquezas e gerador de mais lucro por si mesmo;
- Vendas à vista: não se dá aquele famoso golpe de pegar o produto e pagar no ano seguinte, é praxe entre nós;
- Neutralidade religiosa, política, social, sexual e racial: todos são irmãos, com os mesmos direitos e deveres, com a mesma dignidade;
- Educação cooperativista: um pequeno fundo é reservado para a educação dos sócios. Desde o início se percebeu que sem uma educação dos sócios, sem formação duma consciência política e social, a exploração de uns sobre os outros se tornaria uma fatalidade. Esse é o grande problema de nossa cooperativa brasileira;
- Integração Cooperativista: é a cooperação que deve existir não só internamente numa cooperativa, mas também entre as diversas cooperativas, se todos têm o mesmo ideal, somente pela união e integração conseguirão fazer valer seus princípios e seus interesses” (Guarechi, sociologia Critica, 1989).

                As Cooperativas brasileiras infelizmente, não são unânimes em seguir esses mandamentos do cooperativismo, sobretudo nossas cooperativas da Amazônia. A Cooperativa dos Garimpeiros de Serra Pelada, criada em 1983, é uma Cooperativa que, teoricamente se baseia nesses princípios de Rochdale. No entanto, na prática, se revela totalmente fora do sistema de cooperativismo.
            Pois segundo esses mandamentos do cooperativismo, como afirma Guarechi, esta é uma forma de organização que nasce da vontade popular, levada por impulsos mútuos de fortalecimento de uma classe - no caso aqui, a garimpeira - e em Serra Pelada se assiste a criação de uma cooperativa que nasce do poder político e militar, que privilegia apenas os que têm o poder econômico e assim ao invés de unir os homens, enfraquece a classe envolvida (BARROS 1990).
            Portanto, essa cooperativa em vez de unir esforços, nasce enfraquecida, pois visa atender apenas os interesses individuais em preferência aos interesses coletivos.
            Ana Maria Martins Barros, afirma que a Cooperativa dos Garimpeiros de Serra Pelada (COOGAR), foi uma das pioneiras na região amazônica e é um exemplo das cooperativas mal sucedidas no território brasileiro. Pois desde o início da sua criação não atendeu a nenhum dos critérios que eram exigidos para que uma cooperativa seja considerada autêntica.
            Nasceu do poder político, econômico e militar, dentro de uma ditadura, sem que os seus associados tenham consciência dessa manipulação de interesses. Enfim, a Cooperativa dos Garimpeiros de Serra Pelada não nasceu da vontade nem da decisão do povo. A criação da Cooperativa dos Garimpeiros de Serra Pelada, na verdade, teve sua idéia embrionária, no inicio de 1982, quando das campanhas políticas para governadores, deputados, prefeitos e vereadores. Idéias estas que foram desencadeadas pelo candidato a Deputado Federal Sebastião Rodrigues de Moura, conhecido popularmente por “Curió”, que via na iniciativa uma forma de manipular as massas garimpeiras e sair-se vitorioso como Deputado Federal pelo Pará no Partido Democrático Social (PDS).
            Esse movimento que dera origem a Cooperativa dos Garimpeiros de Serra Pelada, encabeçado pelo Major Curió, ainda em sua campanha política no inicio de 1982, foi responsável pela sua popularidade entre os garimpeiros, época em que o Major fazia questão de mostrar-se democrático e totalmente sensibilizado com os problemas dos garimpeiros.
            A Cooperativa foi oficializada em 1983. O idealizador da Cooperativa nessa época já era o “Deputado Curió”, que tinha sido eleito com total apoio dos garimpeiros. Era chegada a hora do Deputado retribuir os votos que ganhara. Só que a partir daí as coisas mudaram (BARROS, 1990). O Deputado que outrora se mostrara sensibilizado com a classe garimpeira não quis saber da participação deles nas decisões políticas dentro da Cooperativa. Se a criação da Cooperativa não germinou da vontade e decisão dos garimpeiros, e sim do poder político/militar, muito menos as primeiras Diretorias da Cooperativa.
            Segundo Barros, não houve eleições para a escolha da diretoria da entidade. As primeiras diretorias foram nomeadas autoritariamente, o que mostra claramente uma fuga do segundo princípio cooperativista que rege “gestão democrática – tudo decidido por eleição”. O Deputado já estava eleito. Não havia, portanto, motivos para atitudes democráticas. Foi então nomeado o Sr. Geraldo Dantas, para presidir a primeira diretoria da Cooperativa dos Garimpeiros de Serra Pelada – COOGAR.
            A nomeação do Sr. Geraldo Dantas, feita pelo Deputado trazia duas vantagens: por um lado havia a aparência de uma escolha democrática, porque o Sr. Geraldo Dantas foi escolhido, entre os garimpeiros. Por outro lado este cidadão seria um elemento facilmente manipulável, dado o seu nível intelectual e que por isso não significava grande obstáculo aos planos já traçados pelo governo com relação àquela Cooperativa.
            Foi então regulamentada a situação da Cooperativa, que se firmava como entidade representativa dos interesses da comunidade de garimpeiros, uma de suas atribuições seria contratar serviços, mediante licitação pública para executar os serviços de rebaixamento. Mas o governo sabia que a entidade não teria suporte econômico para arcar com as despesas de rebaixamento, no entanto colocou este item como obrigação da cooperativa.
            Com esta obrigatoriedade imposta à Cooperativa dos Garimpeiros de Serra Pelada, o governo pretendia mostrar a inviabilidade do sistema a fim de tomar o garimpo dos garimpeiros. A COOGAR não tinha recursos e os diretores eram manipulados pela coordenação do garimpo. Havia uma grande instabilidade no garimpo, e certa expectativa por parte dos garimpeiros. Precisavam de condições de trabalho e isso só seria possível com o rebaixamento das paredes da cava,[11] e que para isso precisavam de mão-de-obra mecanizada.
Esse problema de aprofundamento na cava passou a refletir na queda da produção, levando os garimpeiros ao desespero e levando o governo a aproveitar o impasse para decretar o fechamento do garimpo à lavra manual, dando preferência ao desenvolvimento da lavra mecanizada pela Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), que já possuía a concessão de lavra daquela área desde 1974, concedida pelo governo, através do Decreto de Lavra Nº. 7.509/74, onde reza que “o garimpo de Serra Pelada, está dentro da concessão de lavra outorgada pela CVRD” (BARROS, 1990 ).
            Os garimpeiros associados da COOGAR, insatisfeitos com a atitude do órgão que lhes davam representatividade, por não compreenderem como era realmente feita as negociações pela entidade, resolveram convocar assembléias gerais trocando de diretores sucessivamente. Mas o problema não estava na direção da Cooperativa, e sim na conjuntura em que foi criada a Cooperativa (BARROS, 1990).
            Essa insatisfação levou os garimpeiros a atacarem os diretores de corruptos e em 1987, acabaram incendiando a cooperativa. Começava assim um estado de conflito entre garimpeiros e o Estado, que assistia a tudo e, no entanto não se manifestava em favor do garimpeiro no sentido de resolver o problema de rebaixamento da cava dando possibilidade de trabalho aos garimpeiros pois, como já foi mencionado, o objetivo do governo era que os garimpeiros não conseguisse mais trabalhar para que pudesse entregar o garimpo a CVRD, detentora do direito de lavra segundo o Decreto Nº. 7.509/74. 

O massacre da ponte do Rio Tocantins
            Premidos pela necessidade e inconformados com a situação, os garimpeiros resolvem lutar de forma mais direta para conseguir seus objetivos, e no final de dezembro de 1987 fecham a ponte rodoferroviária sobre o rio Tocantins em Marabá. Como uma forma de falarem da sua insatisfação, eles se posicionaram ali em defesa daquilo que eles supunham seus direitos. 
Os garimpeiros querem que o governo federal pague 55 milhões de cruzados, referentes a paládio e prata adquiridos e não pagos pela Caixa Econômica Federal [...] pedem ainda a ampliação da reserva garimpeira atualmente de cem (100) hectares, para seiscentos e cinqüenta (650) hectares, e a anulação dos direitos de lavra da Companhia Vale do Rio Doce, que assim desistiria definitivamente de retomar o controle da área. Os garimpeiros querem também investimentos em infra-estrutura de apoio a Serra Pelada... (Jornal O Estado de S. Paulo, pág. 10 em 29- 12- 1987).

            Segundo o Sr. Wilson Faval de Melo,[12]  a ocupação da ponte provocou uma serie de problemas para os usuários da rodovia PA-150 e também para os usuários da Estrada de Ferro Carajás. Wilson afirma ainda que convocado para dar assistência aos ocupantes
...percorremos a área ocupada assim como o posto de apoio da folha dezoito na Nova Marabá, onde se encontrava a cozinha e depósitos de gêneros alimentícios. Calculamos que na ponte deveria haver aproximadamente umas mil ou mil e quinhentas pessoas, entre homens, mulheres adultos e menores de 14 anos. A situação não era clara, ficando visível a falta de organização no aspecto como; a inexistência de grupos para atender as negociações onde estivessem representados os seguimentos sociais de Serra Pelada, grupos encarregados de fazer e distribuir a alimentação, pessoas encarregadas de fornecer as informações entre a mesa de negociação e os ocupantes, pontos de contato entre a liderança da Serra, ocupantes da ponte e negociadores, falta de apoio no transporte etc. (Relatório da Defesa Civil de Marabá).  
            De acordo com o Sr. Wilson, não tinham os ocupantes da ponte, a intenção de fazer uma manifestação violenta, haja vista a quantidade de mulheres – algumas delas grávidas - e crianças que faziam parte do grupo. Eles laboraram uma lista pedindo água, pratos descartáveis, panelas, alimentação (pão) e talheres, pois não tinham com que comer e cortar a carne. [13] O delegado da Policia Federal Sr. Wilson Alfredo Perpétuo confirma isso quando diz em seu relatório que “a manifestação era pacífica e que os garimpeiros estavam totalmente desarmados”.[14] A situação tornou-se tensa, à medida que o tempo passava e não havia uma resposta positiva de que seriam atendidas as reivindicações dos garimpeiros.
            Enquanto os garimpeiros mantiam a ocupação da ponte o representante do Ministério do Interior Nelson Marabuto – na prefeitura - intensificava as negociações com as autoridades competentes juntamente com o Dep. Asdrúbal Bentes que era o negociador enviado pelo governador do estado Helio Gueiros, o prefeito de Marabá Sr. Hamilton Bezerra e lideranças garimpeiras.
Nesta reunião foram apresentadas três propostas que seriam levadas, imediatamente a seguir, aos garimpeiros que garantiam o bloqueio da ponte. Pela primeira proposta os garimpeiros deixariam desobstruída a parte rodoviária da ponte, mas poderiam manter o bloqueio sobre os trilhos da ferrovia. A segunda proposta incluía a desinterdição total da ponte e um posterior acampamento no pátio de maquinas das Construtoras Beter e Construmil – ambas cogitadas para participar dos trabalhos de rebaixamento das catas do garimpo de Serra Pelada. Pela terceira proposta, a ponte rodoferroviária também seria aberta ao tráfego, mas os garimpeiros se concentrariam num acampamento armado na Praça Duque de Caxias, em Marabá.[15]
A reunião terminou por volta das duas e meia da manhã daquela terça-feira, e havia duvidas por parte de alguns dos garimpeiros quanto ao cumprimento dessas propostas que para eles eram paliativas. Esta foi uma maneira encontrada pelos negociadores para que pudessem contornar a situação sem que houvesse intervenção militar, para evitar derramamento de sangue.
Pouco tempo depois de encerrada a reunião, e quando as lideranças dos garimpeiros já iam se dirigir à ponte para levar as três propostas a apreciação dos manifestantes, foi dado um telefonema para a prefeitura. Era o comandante do 4º Batalhão da Polícia Militar – sediado em Marabá -, o tenente – coronel Reinaldo Pessoa Chaves, informando que, naquele exato momento, estava se deslocando com um contingente de 340 homens para a ponte, com o objetivo de desobstruí-la de qualquer maneira. [16]
                O coordenador da Defesa Civil de Marabá, o Sr. Wilson Faval diz em seu relatório que estava muito preocupado com a situação daquelas pessoas mas, não acreditava na especulação de uma intervenção policial, e confirmou isso à D. Alzira, quando esta lhe perguntou sobre os boatos que corriam de que o governador estava mandando para o local uma tropa de choque da policia militar, afim de desobstruir a ponte. Ele afirma que:
Durante toda a tarde procuramos soluções para a solicitação dos grevistas, especialmente água. Por volta das 18: hs, voltamos para a ponte ao lugar onde era feita a comida, depois de falar e confirmar algumas coisas nos encaminhamos para a saída, nesse instante começou a ação policial. Na primeira instancia ficamos perplexos, empatados, a angustia fechou as nossas gargantas não conseguimos falar, nossos gritos pareciam pequenos perto das gritarias generalizadas. Os garimpeiros jogaram algumas pedras e começou a balaceira. Bombas de gás e mais tiros. Os soldados se posicionavam da área, corriam, D. Alzira pedia que todos se jogassem no chão, alguém cantava o Hino Nacional, vimos cair uma mulher de estatura baixa com roupas brancas, tivemos a intenção de correr para ajudá-la, estava ela ferida e vimos quando era suspensa e jogada por cima da cerca de segurança da ponte, um rapaz que minutos antes comia sentado na cerca, também caiu, e tudo se tornou uma loucura.[17]
Para o Jornal do Brasil,[18] o governador do Pará, Hélio Gueiros, disse que aprova todas as reivindicações dos garimpeiros de Serra Pelada, embora considere o bloqueio da ponte uma atitude extrema. Se o governador era a favor que as reivindicações dos garimpeiros fossem atendidas, por que então não deu mais uma hora de prazo para os negociadores como pediu Nelson Marabuto? Por que mandou desobstruir a ponte a qualquer custo não levando em consideração as centenas de vidas que ali estavam?
“Todos os esforços foram feitos para que Gueiros adiasse a execução de suas ordens, no sentido dos garimpeiros serem retirados do local a qualquer custo. Pedir que nos desse mais uma hora, que iríamos com agentes federais dizer-lhes que já estava assinado o acordo e que as máquinas exigidas seriam colocadas, em poucas horas, no garimpo. Gueiros não quis dar prazo algum”. [19]
                Uma serie de acusações feitas às Polícias estaduais de Serra Pelada, gerou uma situação de desconforto no garimpo, e elas acabaram sendo expulsas pelo despreparo dos seus homens (senão por outros motivos, por que não conseguem resistir a sedução do dinheiro que escorre invisivelmente pelo garimpo) e pela complexidade do jogo de poder, que exige mais sutileza do que são capazes de ter.
O lance derradeiro ocorreu em outubro de 1986, quando o soldado Jorge Oliveira matou o “formiga” João Borges, num episodio controvertido. Os próprios garimpeiros prenderam o PM e o entregaram à polícia civil, que se recusaram a autuá-lo. Revoltados, mas também estimulados a isso, os garimpeiros destruíram os prédios da delegacia e do quartel literalmente pondo para correr os policiais.[20]
                Na própria ocasião a Polícia Militar ensaiou – segundo Lúcio Flávio Pinto[21] – um revide, mobilizando duzentos homens para invadir o garimpo, mas por Brasília a iniciativa foi sustada. Quando o governador Hélio Gueiros autorizou a PM a desobstruir a ponte, “de qualquer maneira”, vários dos militares que não haviam esquecido o passado, para eles humilhante, acharam que chegara a hora de ajustar as contas, indo além do que exigia uma operação como aquela.
            Segundo o relatório do delegado Wilson Perpétuo assegura como “praticamente certo que as tropas de Marabá dispararam sobre os garimpeiros, enquanto a tropa de choque (que veio de Belém) não fez uso de armas de fogo, embora estivesse armada com revólveres”. Esse detalhe comprovaria que a PM estava se vingando da “desonra” de 14 meses antes.
No relatório da defesa Civil, é desmentida uma informação errada transmitida pela Polícia Federal e que pode ter sido o estopim para a ordem drástica que deu o governador e na disposição dos policiais para cumpri-la.
Momentos antes do início da operação de desobstrução da ponte, o delegado da Polícia Federal de Marabá informou através de telex, repassado ao governador do estado pela coordenadoria regional do Pará, em Belém, que os garimpeiros, ao tomarem conhecimento da chegada à cidade de Marabá do pelotão de choque da Polícia Militar e da possível chegada de outro pelotão de choque, decidiram, em caso de repressão da PM, atearem fogo em todos os veículos que se encontram sobre a referida ponte e ainda manterem como refém o Dr. Nelson Marabuto, que preside as negociações em Serra Pelada em nome do ministro do Interior. [22]
                Isso foi contundentemente rebatido pelo Sr. Wilson coordenador da Defesa civil em Marabá testemunha, depois de vistoriar a ponte, ter percebido “claramente que os garimpeiros que ocupavam a ponte não estavam com a intenção de cometer atos de violência e que estavam somente desorientados por falta de informações dos próprios dirigentes” [23]. Evidentemente, não se tratava de um movimento completamente pacífico, mas a ação dos garimpeiros esteve sempre aquém da violência utilizada pela PM.
 Segundo o Ministério do Interior, foi Hélio Gueiros quem procurou Brossard para pedir seu respaldo. Mas o governador já vinha sendo pressionado pelo ministro Paulo Brossard no sentido de que a ponte deveria ser desinterditada o mais rápido possível. O ministro teria dito a Gueiros que o assunto pertencia a alçada estadual. E logo depois da desobstrução da ponte não quis mais falar dos acontecimentos.[24] Gueiros argumentou que a obstrução causava prejuízos econômicos. Mas esse prejuízo era para quem? Para o estado ou para a CVRD?
O governador disse que sua decisão diante do bloqueio da rodovia PA-150 e da ferrovia Carajás - Ponta da Madeira, de propriedade da companhia Vale do Rio Doce, não poderia ser outra.[25]  “o governo fez o que tinha que fazer” [26] disse Gueiros. Para o governador, era mais preferível que pessoas morressem à mineradora ter prejuízos. Nelson Marabuto disse que “não foi uma ação de desobstrução, mas uma ação premeditada no sentido de evacuar, a qualquer custo, aquela ponte”.[27] Na realidade não parece que queriam retirar os manifestantes pacificamente, pois fecharam as duas cabeceiras da ponte não deixando outra saída para os garimpeiros a não ser o gradil de proteção por onde os mesmos pularam na hora do tiroteio.
“Não houve massacre maior, na história recente do Brasil – pelo menos desde de Canudos.(...) Estavam desarmados os trezentos e poucos garimpeiros que, no final da tarde, e início da noite de 29 de dezembro de 1987, foram cercados pelos dois lados da ponte sobre o rio Tocantins, na rodovia PA – 150, e trucidados por 500 soldados da PM paraense, sendo que, pelos cálculos de um relatório inicial da Polícia Federal, morreram, ‘entre duas ou três dezenas’ de garimpeiros.(...) A PM atacou dos dois lados. Com bombas de gás, metralhadoras e fuzis calibre 762. Sob bombardeio garimpeiros tentam escapar jogando-se da ponte de 76 metros de altitude. Uma mulher grávida cai, fuzilada; há crianças no meio.” (PETER, Cyntia. A chacina na Ponte. Revista Senhor nº. 335, de 12.01.1988. p.32-36).
O assessor Wilson Alfredo Perpétuo, do Departamento de Polícia Federal, afirmou, que “houve uma crise de poder, de orgulho e afirmação de autoridade” do governador.[28] Apesar de vivermos em um pais democrático, em determinadas regiões ainda prevalece o absolutismo. FULCAULT, em sua obra, Vigiar e Punir nos mostra como se fazia valer a lei na era clássica.
Ele explica que, se foi cometido alguma coisa proibida por lei, isso era considerado um delito que exige reparação, porque o direito superior é violado e era injuriar a dignidade de seu caráter. O crime além de sua vítima imediata, ataca o soberano; ataca-o pessoalmente, pois a lei vale como vontade do soberano; ataca-o fisicamente, pois a força da lei é a força do príncipe, e para que uma lei pudesse vigorar neste reino, era preciso necessariamente que emanasse diretamente do soberano, e pelo menos que fosse confirmada com selo de sua autoridade.
A intervenção do poder soberano na punição dos crimes é sem dúvida uma das partes essenciais na administração da justiça. O castigo então não pode ser identificado nem medido como reparação do dano; deve haver sempre na punição pelo menos uma parte que é a do príncipe; e mesmo quando se combina com a reparação prevista, ela constitui o elemento mais importante da liquidação penal do crime.
Ora, essa parte que toca ao príncipe, em si mesma, não é simples: ela implica ao reino (a desordem instaurada, o mau exemplo dado, são prejuízos consideráveis que não tem comparação com o que é sofrido por particular.); mas implica também em que o rei procura a vingança de uma afronta feita à sua pessoa.
O direito de punir será então como um aspecto do direito que tem o soberano de guerrear seus inimigos; castigar provém desse direito de espada, desse poder absoluto de vida ou morte de que trata o direito romano ao se referir ao merum imperium, direito em virtude do qual o príncipe faz executar sua lei, ordenando a punição do crime. Mas o castigo é também uma maneira de buscar uma vingança pessoal e pública, pois na lei a força física política do soberano está de certo modo presente. Portanto, a lei tende não só defender mas também vigiar o desprezo de sua autoridade com a punição daqueles que vieram a violar suas defesas.
O cerimonial meticuloso é de uma maneira muito explicita, não só judicial mas militar. A justiça do rei mostra-se como uma justiça armada. O gládio que pune, destrói os inimigos. Todo um aparato militar cerca o suplício: sentinelas, arqueiros, soldados. Pois importa, evidentemente, impedir qualquer evasão ou ato de violência; importa também, da parte do povo, um movimento de simpatia para os condenados, ou mais uma onda de indignação para matá-los imediatamente: importa lembrar que em todo crime há uma espécie de sublimação contra a lei e que o criminoso é um inimigo do príncipe. Todas essas razões – quer sejam de preocupação numa determinada conjuntura, ou de função no desenrolar de um ritual, fazem da execução pública mais uma manifestação de força do que uma obra de justiça, ou antes, é a justiça como força física, material e temível do soberano que é exibida. A cerimônia do suplício coloca em plena luz a relação de força que dá poder à lei.
No ritual da lei armada o príncipe se mostra ao mesmo tempo, e de maneira invencível sob duplo aspecto de chefe da justiça e chefe da guerra. A execução pública tem duas faces: uma de vitória, e outra de luta. De um lado, ela pede o desfecho entre o criminoso, e o soberano, cujo resultado é conhecido antecipadamente: ele deve manifestar sem medidas o poder do soberano sobre aqueles que reduziram à impotência. A dessimetria, o irreversível desequilíbrio das forças fazia parte das funções do suplício. Um corpo liquidado, reduzido à poeira e jogado ao vento, um corpo destruído parte por parte pelo poder infinito do soberano, constitui o limite não só ideal mas real do castigo.
 A concepção foucautiana de poder em Vigiar e Punir, nos revela que o rei exercia um poder absoluto no estabelecimento da verdade.
Procura mostrar as conseqüências do suplício. Afirma que, o suplício se inseriu tão fortemente na prática judicial, porque é revelador da verdade e agente do poder. Ele promove a articulação do escrito com o oral do secreto com o público, do processo de inquérito com a aprovação de confissão: permite que o crime seja reproduzido e voltado contra o corpo visível do criminoso; faz com que o crime, no mesmo horror, se manifeste e se anule, faz também do corpo do condenado o local de aplicação da vindita soberano, o ponto sobre o qual se manifesta o poder, a ocasião de afirmar a dessimetria das forças.
Podemos fazer uma análise da chacina da ponte executada pela polícia militar a mando do governador, comparando com o poder do soberano citado por Foucault, pois o mesmo queria exercer o poder de sua soberania diante da reivindicação dos garimpeiros no dia 29 de dezembro de 1987, quando autorizou que fosse desobstruída a ponte de “qualquer jeito”. Segundo o relatório da Policia Federal, cerca de 133 pessoas desapareceram depois do massacre. Não se sabe ao certo quantas dessas foram consideradas oficialmente mortas, mas acredita - se que são muito mais do que apenas duas como afirma a Polícia Militar. A ação da PM não durou mais do que 15 minutos, isso nos leva a acreditar que as especulações em torno da quantidade de mortos – que teriam teriam sido enterradas algumas vitimas em cemitérios clandestinos - não devem ser levadas em consideração, pos a menos que a polícia tivesse o apoio de uma boa logística, isso seria impossível.
Certo é que: o coordenador da Defesa Civil, Wilson de Melo, afirma ter visto quatro corpos e que segundo ele admite até nove as pessoas que morreram naquele episódio vítimas da ação covarde da Polícia Militar – pois depoimentos afirmam que a maioria das vítimas foram baleadas pelas costas ao fugir da represaria da PM – quando da desobstrução da ponte, naquele fatídico dia 29 de dezembro de 1987.




[1] Bate-paus. Pessoas que faziam serviço de espionagem e delatação de alguma irregularidade à coordenação.
[2]   KOTSCHO, Ricardo. Uma ferida aberta na selva, p.16. Editora brasiliense S/A. São Paulo. 1994.
[3]  SENADO FEDERAL - secretaria legislativa. CC - 1 . Subsecretaria de taquigrafia 29/08/96.
[4] VASCONCELOS, Diogo de. História Média de Minas Gerais. Belo Horizonte, Imprensa Oficial, 1918. Maxwell, Kenneth. A Devassa da Devassa: A Inconfidência Mineira, Brasil e Portugal: 1750-1808. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1978.
[5] Sociólogo na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Mestre em Extensão Rural na Universidade Federal de Viçosa (UFV). Doutorando em Ciências Sociais na Universidade Campinas (UNICAMP)
[6] Idem.
[7] Ibidem.
[8] MARTINS, Ana Luiza. Breve história dos garimpos de ouro no Brasil. In: ROCHA, Gerôncio. Em busca do ouro.        Rio de Janeiro, Marco Zero, 1984.
[9] BARROS, Ana Maria Martins. A vida social de Serra Pelada - suas formas de organização 1980 – 1990. UFPA. Marabá, 1990.
[10] Idem.
[11] Cavidade artificial feita na terra onde se localizam os barrancos.
[12] Coordenador da Defesa Civil de Marabá em 28-12-1987.
[13] Idem.
[14] Folha de S. Paulo, p 01. 06/01/1988.

[15] Fonte: CPT – Comissão Pastoral da Terra.
[16] Idem.
[17] Relatório da Defesa Civil.
[18] Fonte: Jornal do Brasil, 29 /12/1987.
[19] Fonte: Jornal de Brasília. 31/12/1987.
[20] Jornal Pessoal. Ano I Nº. 10 -  Janeiro de 1988.
[21] Jornalista. Editor do Jornal Pessoal.
[22] Fonte: Idem.
[23] Relatório da Defesa Civil de Marabá, 28-12-1987.   
[24] Fonte: Jornal Pessoal. Janeiro de 1988.
[25] Fonte: Jornal do Brasil. 02/01/1988.
[26] Fonte: O Globo – Rio de Janeiro. 31/12/1987.
[27] Fonte: Jornal do Brasil. 07/01/1988.
[28] Fonte: Jornal do Brasil. Pág. 05.  02/01/1988.

3 comentários:

  1. Muito bom o seu texto. Pena que, em alguns pontos, dado a forma como o seu blog está configurado, fica impossível ler.

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  2. Queria saber de nomes de pessoas que foram acidentadas ou morreram no garimpo de serra pelada em ,1989 meu irmão trabalhava nessa época nunca mais vimos so soubemos que estavam internado no hospital regional Vale do Peixoto fomos la mais não encomtramos se alguém soube de alguns dessa epoca me avisa elzadiasdoassantos@yahoo.com.br

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  3. Queria saber de nomes de pessoas que foram acidentadas ou morreram no garimpo de serra pelada em ,1989 meu irmão trabalhava nessa época nunca mais vimos so soubemos que estavam internado no hospital regional Vale do Peixoto fomos la mais não encomtramos se alguém soube de alguns dessa epoca me avisa elzadiasdoassantos@yahoo.com.br

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